Fraude? Golpe? Entenda o que está acontecendo na Bolívia

A Bolívia amanhece nesta segunda-feira (11) um país diferente do que foi nos últimos anos. Na véspera, o presidente Evo Morales anunciou sua renúncia, dizendo ser vítima de um golpe de Estado, e foi acompanhado pelos demais nomes na linha sucessória.

A queda de Morales ocorre em meio a confrontos violentos nas ruas do país, desencadeados por denúncias de fraude nas eleições presidenciais de 20 de outubro. Ninguém sabe ao certo o que acontecerá em seguida.

No poder desde 2006, Morales foi o primeiro presidente indígena do país e um dos expoentes da esquerda na América Latina. Ele é aclamado por ter promovido a redução dos níveis de pobreza, mas nos últimos anos passou a ser criticado por deturpar regras constitucionais para se manter no cargo.

Entenda o que está acontecendo na Bolívia:

1. Denúncias de fraude eleitoral geraram convulsão nas ruas

A crise em curso na Bolívia começou com as eleições presidenciais de 20 de outubro. Após idas e vindas na apuração, Morales foi declarado vencedor no primeiro turno, mas o líder opositor Carlos Mesa não reconheceu o resultado.

A candidatura do líder socialista já era alvo de controvérsia, pois ele fez vista grossa às regras constitucionais e ao resultado de um plebiscito realizado em 2016 que negavam ao presidente o direito de concorrer ao cargo indefinidamente.

O impasse nas urnas gerou protestos de simpatizantes e detratores de Morales. Em meio à violência generalizada, houve saques a estabelecimentos comerciais e ataques às residências de figuras ligadas ao governo –ao menos três pessoas morreram e 300 ficaram feridas.

Na semana passada, integrantes das forças de segurança passaram a recusar as ordens de reprimir as manifestações. Para resolver a crise, Morales convidou observadores da OEA (Organização dos Estados Americanos) a realizar uma auditoria eleitoral.

2. Morales renunciou após pressão da OEA e das Forças Armadas

A crise na Bolívia atingiu seu  ápice no domingo (10). Durante a manhã, o secretário-geral da OEA, Luis Almagro, declarou ter encontrado indícios de fraude no pleito de outubro. Pouco depois, Morales anunciou a convocação de novas eleições.

Mas a tensão só aumentou ao longo do dia. O chefe das Forças Armadas, Williams Kaliman, fez um pronunciamento à tarde recomendando que Morales renunciasse ao cargo para apaziguar o país.

Cada vez mais isolado, o presidente voou para Cochabamba, seu reduto eleitoral, e anunciou sua renúncia dizendo ser vítima de “um golpe cívico, político, policial”. Ele foi seguido por seu vice-presidente e pelos presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, os próximos nomes na linha sucessória.

A renúncia foi festejada por opositores nas ruas das principais cidades do país; em La Paz, Mesa declarou o “fim da tirania” e pediu a realização de novas eleições. À noite, a polícia prendeu membros do Tribunal Supremo Eleitoral.

3. Vácuo de poder sugere que crise está longe de terminar

Já fora do poder, Morales disse que a sua casa havia sido vandalizada. Ele também afirmou ser alvo de uma ordem de prisão, mas os militares desmentiram a informação. Autoridades do México ofereceram asilo ao ex-presidente e anunciaram que 20 ministros e deputados já estão refugiados na embaixada mexicana em La Paz.

Para complicar ainda mais a situação, a renúncia de Morales precisa ser aprovada pela Assembleia Legislativa, onde ele conta com maioria. Como todos na linha sucessória também renunciaram, não está claro o que acontecerá em seguida.

Em meio ao vácuo de poder, a opositora Jeanine Áñez, que ocupa a segunda vice-presidência do Senado, disse estar preparada para “assumir formalmente a responsabilidade segundo a ordem sucessória” e prometeu organizar novas eleições.

No fim das contas, o impasse deixa mais perguntas do que respostas. Quem ocupará a Presidência? Haverá novas eleições? Se for o caso, Morales poderá concorrer? Que papel cumprirão as Forças Armadas na transição? O fato de estas perguntas não poderem ser respondidas agora é mau sinal para a democracia na Bolívia.