Abiy Ahmed ganhou o Nobel da Paz, mas democracia na Etiópia ainda é promessa

O primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, ganhou o Nobel da Paz nesta sexta-feira (11), mas sua promessa de liderar a transição para a democracia neste país do Chifre da África segue incompleta.

O prêmio é uma recompensa pelos esforços de Abiy, 43, em prol da abertura política e da normalização das relações com a vizinha Eritreia após décadas de animosidade. Desde que chegou ao poder, em abril de 2018, ele libertou milhares de presos políticos e fez concessões territoriais importantes ao país rival.

Em meio à abertura política, a Etiópia enfrenta tensões crescentes entre as forças que compõem a EPRDF (Frente Democrática e Revolucionária do Povo Etíope), coalizão que controla a vida política no país com mão de ferro desde 1991.

A chegada de Abiy ao poder é um reflexo destes conflitos internos. Ele se tornou o primeiro chefe de governo a representar os oromos, maior grupo étnico do país, após uma revolta popular provocar a renúncia de seu antecessor, Hailemariam Desalegn.

Desde então, a tensão só piorou. Em junho, o líder da região de Amhara, Ambachew Mekonnen, foi assassinado em uma tentativa de golpe de Estado. A violência entre grupos étnicos etíopes forçou 2,4 milhões de pessoas a fugir de suas casas nos últimos anos, de acordo com a ONU (Organização das Nações Unidas).

Há temores de que a instabilidade leve ao adiamento das eleições gerais marcadas para maio de 2020 –este seria o primeiro pleito com a participação efetiva da oposição.

“Movimentos nacionalistas étnicos e outras [forças] da oposição têm tirado proveito da abertura política iminente, gerando ainda mais instabilidade”, diz um relatório de julho do think-tank International Crisis Group. “É preciso acalmar as tensões crescentes antes que elas sabotem a transição na Etiópia.”

Também há preocupações em relação às liberdades de expressão e de imprensa na Etiópia. Vários jornalistas foram libertados após a anistia concedida por Abiy, mas organizações de direitos humanos registraram novos abusos nos últimos meses.

Em setembro, cinco jornalistas foram presos sob a acusação de incitar o terrorismo. Eles são integrantes da Voz da Juventude pela Liberdade, que monitora as violações de direitos humanos no país.

“O uso da proclamação antiterrorismo da Etiópia para prender jornalistas arbitrariamente está em descompasso com as reformas registradas no país”, disse a ONG Anistia Internacional em nota, na qual exige a libertação dos profissionais de imprensa detidos.

Com 110 milhões de habitantes, a Etiópia é o segundo país mais populoso da África, atrás da Nigéria. É também uma das economias que mais cresceram no continente na última década.

No fim das contas, o Nobel da Paz deste ano é um voto de confiança na liderança de Abiy, mais do que um atestado do sucesso da transição democrática na Etiópia. Resta torcer para que a escolha do comitê norueguês se mostre acertada, ao contrário de outros vencedores que decepcionaram, como Juan Manuel Santos (2016), Barack Obama (2009) e Aung San Suu Kyi (1991).

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