Três anos após golpe frustrado, Turquia vê luz no fim do túnel do autoritarismo de Erdogan

Três anos após uma tentativa de golpe militar fracassada contra o presidente Recep Tayyip Erdogan, a Turquia começa a ver saídas para o autoritarismo que tomou conta das estruturas de poder desde os eventos de 15 de julho de 2016.

Naquele dia, uma facção rebelde das Forças Armadas atacou a sede do Parlamento turco e prédios do governo na capital, Ancara, sem, contudo, conseguir depor Erdogan. Os enfrentamentos entre militares insurgentes e civis nas ruas do país, transmitidos em tempo real para todo o mundo por meio das redes sociais, deixaram 251 mortos e mais de 2.000 feridos.

Nesta segunda-feira (15), Erdogan celebrou o terceiro aniversário da derrota do levante militar participando de cerimônias em homenagem às vítimas do incidente. “Nós comemoramos nos mártires heroicos, que deram suas vidas pelo bem do nosso país”, disse a primeira-dama Emine Erdogan, de acordo com a agência de notícias estatal Anadolu.

A tentativa de golpe de julho de 2016 representa um divisor de águas na história recente da Turquia, que já havia registrado investidas dos militares em 1960, 1971, 1980 e 1997. Após o episódio, Erdogan –que está no poder desde 2003– recrudesceu seu controle sobre as instituições do país.

O governo turco insiste que o levante militar foi organizado pela FETO, organização terrorista liderada pelo clérigo Fethullah Gülen, ex-aliado de Erdogan que vive exilado nos Estados Unidos. Por sua vez, Gülen nega envolvimento no episódio.

Nos meses que se seguiram à tentativa de golpe, Erdogan liderou um expurgo contra supostos seguidores de Gülen infiltrados em órgãos do Estado. Mais de 150 mil funcionários públicos foram demitidos, 500 mil pessoas foram presas e 189 veículos de imprensa tiveram de fechar suas portas, de acordo com a organização de direitos humanos Turkey Purge.

Erdogan aproveitou o clima de caça às bruxas para intensificar o combate à milícia separatista curda Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK na sigla em turco) e grupos aliados na Síria e no Iraque.

Ademais, o expurgo promovido por Erdogan foi internacionalizado. Autoridades da Turquia vêm pressionando governos parceiros, inclusive o Brasil, a extraditar dissidentes, sem muito sucesso até agora.

Em abril de 2017, Erdogan venceu um plebiscito sobre a expansão dos poderes presidenciais. Além disso, ele foi reeleito para um novo mandato de cinco anos nas eleições gerais antecipadas de junho de 2018. Os pleitos, realizados em meio a um estado de emergência que se estendeu por dois anos após a tentativa de golpe, foram marcados por denúncias de fraude.

A LUZ NO FIM DO TÚNEL

Apesar do autoritarismo crescente de Erdogan, a sociedade civil e os partidos de oposição na Turquia dão sinais de vitalidade.

Nas eleições municipais de março, o líder turco viu sua agremiação –o Partido Justiça e Desenvolvimento (AKP, na sigla em turco), de orientação islamita– ser derrotada nas maiores cidades do país: Istambul, Ancara e Esmirna.

Novas eleições foram realizadas em Istambul em 23 de junho, após o AKP questionar os resultados da primeira votação, mas o resultado se manteve: Ekrem Imamoglu, do oposicionista Partido Popular Republicano (CHP, na sigla em turco), foi eleito prefeito com 54% dos votos.

A vitória da oposição em Istambul é emblemática. A cidade de 16 milhões de habitantes foi governada por Erdogan entre 1994 e 1998 e era um bastião eleitoral do AKP.

Agora, o partido governista precisará reconfigurar sua estratégia de poder, ancorada principalmente no apoio de eleitores conservadores em áreas rurais da Turquia.

“O quão rapidamente chegará o fim de Erdogan dependerá da unidade da oposição”, escreveu Gary M. Grossman, professor da Universidade do Estado do Arizona (EUA), em artigo recente para o site The Conversation.

“A aura de invencibilidade de Erdogan aparenta estar se dissipando, e a Turquia parece se aproximar do dia em que a troca de poder é vista como uma parte normal e corriqueira da vida política.”