Veja 4 lições dos conflitos no Oriente Médio para a crise na Venezuela

Líderes opositores na Venezuela organizam nesta quarta-feira (23) uma manifestação em Caracas, na expectativa de aumentar a pressão contra o regime do ditador Nicolás Maduro.

Maduro tomou posse no início de janeiro para um segundo mandato presidencial. Países do chamado Grupo de Lima, que inclui o Brasil, não reconhecem a autoridade do líder chavista por considerarem que as eleições presidenciais de maio foram fraudadas.

A Venezuela enfrenta uma grave crise econômica e humanitária. Mais de 3 milhões de pessoas, cerca de 10% da população, fugiram do país nos últimos anos. Enquanto isso, Maduro intensifica a repressão contra dissidentes.

Resolver o impasse na Venezuela é um dos principais desafios da diplomacia na região. A análise de conflitos em outras partes do mundo pode ajudar formuladores de política externa a encontrar saídas para a crise.

Veja quatro lições dos conflitos no Oriente Médio para a crise na Venezuela:

1. Ondas de protestos têm efeitos imprevisíveis

Ainda não se sabe qual será o impacto das manifestações de rua convocadas pela oposição na Venezuela. Nos últimos anos, ondas de protestos violentos foram reprimidas pelas forças de segurança do regime Maduro e terminaram com dezenas de mortos, sem alcançar mudanças expressivas.

No Oriente Médio, as revoltas populares da Primavera Árabe, em 2011, tiveram desfechos diversos. Na Tunísia e no Marrocos, as manifestações levaram a reformas democratizantes, enquanto no Bahrein e, posteriormente, no Egito, houve o recrudescimento de regimes autoritários. Nos piores cenários, os protestos mergulharam a Líbia, a Síria e o Iêmen em guerras civis duradouras.

2. Reconhecer um governo paralelo pode ser uma cilada

A estratégia de alguns governos da América Latina para lidar com a crise na Venezuela passa por reconhecer um governo paralelo encabeçado por Juan Guaidó, presidente da Assembleia Nacional, controlada pela oposição. Na semana passada, o chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, recebeu uma delegação de líderes opositores do país vizinho e, nesta quarta, Araújo se referiu a Maduro como “ex-presidente” da Venezuela.

No princípio do conflito na Síria, potências do Oriente Médio e do Ocidente que rechaçavam o regime de Bashar-al Assad passaram a reconhecer a Coalizão Nacional Síria (CNS) como representante legítima do país. Mas a CNS, formada majoritariamente por opositores no exílio, tinha pouca influência sobre as lideranças locais que organizavam a resistência à ditadura de Assad. O resultado foi a formação de um governo paralelo ineficaz e pouco representativo, de modo que o regime sírio gradualmente recuperou sua legitimidade internacional.

3. Intervenções militares podem agravar crise humanitária

O agravamento da crise na Venezuela levou líderes da região a cogitarem uma intervenção militar para derrubar o regime de Maduro. Embora uma invasão ainda não seja a estratégia oficial de nenhum governo, a proposta segue como uma das opções na mesa. A julgar pelos conflitos no Oriente Médio, intervenções militares tendem a agravar crises humanitárias.

Em 2011, uma intervenção da Otan (aliança militar ocidental) ajudou a depor o regime de Muammar Gaddafi, mergulhando o país na anarquia –atualmente, a Líbia é terreno fértil para grupos terroristas e redes de tráfico de pessoas. Da mesma forma, a intervenção liderada pela Arábia Saudita contra os rebeldes houthis no Iêmen desde 2015 sufoca a população local, provocando crises de fome e cólera –hoje, mais de 20 milhões de pessoas dependem de ajuda humanitária no país, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas).

4. Para ditadores, ter apoio da Rússia pode fazer toda a diferença

Enquanto cresce o isolamento da Venezuela entre governos da América Latina, Maduro estreita seus laços com a Rússia. Em dezembro, o ditador venezuelano visitou o presidente Vladimir Putin em Moscou, onde anunciou o recebimento de ajuda financeira e militar do Kremlin.

Ainda não se sabe até que ponto Putin está disposto a apoiar o regime venezuelano, mas o patrocínio de Moscou pode fazer toda a diferença. Na Síria, a vitória de Bashar al-Assad na guerra civil se deve em grande parte ao apoio da Rússia, que ajudou nos combates a grupos rebeldes e vetou diversas resoluções contra o regime de Assad no Conselho de Segurança da ONU.