Trump incita tensão racial em debate sobre reforma agrária na África do Sul

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pôs lenha no conflito racial da África do Sul ao sugerir que um projeto de reforma agrária em debate no país estaria provocando o “assassinato em massa de fazendeiros brancos”.

Em um tuíte postado na noite de quarta-feira (22), o republicano diz ter pedido ao seu secretário de Estado, Mike Pompeo, que “investigue de perto as tomadas e expropriações de terras e fazendas” na África do Sul, bem como uma suposta onda de homicídios contra latifundiários brancos.

O governo sul-africano reagiu nesta quinta (23) dizendo que Trump propagou “informações falsas” e que seu tuíte reflete uma “perspectiva que apenas busca dividir nossa nação e lembrar-nos do nosso passado colonial”. Autoridades sul-africanas pediram à embaixada americana que prestasse esclarecimentos sobre o episódio.

A declaração de Trump foi publicada pouco após a exibição de um programa da Fox News em que o âncora Tucker Carlson, frequentemente elogiado pelo presidente, acusou o governo sul-africano de “expropriar terras de seus cidadãos sem compensação porque têm a cor de pele errada”.

REFORMA AGRÁRIA

A África do Sul vem debatendo uma emenda constitucional que permitiria ao governo acelerar o processo de reforma agrária, eliminando a necessidade de indenizar proprietários que tiverem suas terras confiscadas.

O projeto busca corrigir distorções econômicas herdadas do período do Apartheid (1948-1994), em que a maioria negra da população era impedida de ter propriedades rurais em grande parte do território nacional. Atualmente, os negros compõem 80% da população, mas possuem só 4% das terras do país, segundo o governo.

O presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, sorri durante sessão do Congresso na Cidade do Cabo (Crédito: Mike Hutchings - 15.fev.2018/AP)
O presidente Cyril Ramaphosa (Crédito: Mike Hutchings – 15.fev.2018/AP)

O presidente Cyril Ramaphosa, do partido Congresso Nacional Africano, diz que a reforma agrária aumentaria as terras disponíveis para cultivo e que as expropriações começariam com terras públicas. Porém, críticos do projeto dizem que a reforma agrária pode assustar investidores estrangeiros, prejudicando a economia do país.

Além disso, ativistas que representam os interesses da minoria branca no país afirmam que o projeto contribuiria para uma onda de ataques contra fazendeiros com motivações raciais. Nos últimos anos, o número de fazendeiros mortos tem subido, chegando a 74 vítimas entre abril de 2016 e março de 2017.

Membros da ultradireita nos EUA dizem que os crimes contra fazendeiros na África do Sul são evidência de um suposto projeto de “genocídio branco” no país.

Entretanto, os dados sobre a violência contra proprietários de terra não indicam um viés racial nos assassinatos, nem permitem dizer que a minoria branca sofreria mais do que os negros, historicamente marginalizados no país.

Com o tuíte de quarta-feira, Trump criou atrito diplomático com a África do Sul e deixou claro a influência de âncoras de TV conservadores sobre sua agenda política. Além disso, o presidente deu voz a grupos de extrema direita que associam políticas de reparação a negros a um projeto inexistente de extermínio dos brancos.