5 partidas de geopolítica nos Jogos Olímpicos de Inverno da Coreia
Você pode não dar muita importância a esportes como curling, combinado nórdico e skeleton, disputados de 9 a 25 de fevereiro na Coreia do Sul. Mas estes Jogos Olímpicos de Inverno ganharam uma importância excepcional com as partidas de geopolítica encenadas em paralelo, marcando uma reaproximação talvez histórica entre as duas Coreias — países que estão tecnicamente em guerra desde 1950.
O evento, ainda em sua primeira semana, já contou com uma inédita visita do clã Kim ao sul da fronteira, e também já desagradou aos Estados Unidos de Donald Trump, que preferiam lidar com o conflito exercendo ainda mais pressão econômica e reiterando suas ameaças.
Estes jogos vão encerrar o confronto e finalmente reaproximar os vizinhos? Não. Mas isso não quer dizer que os passos dados nestes dias são irrelevantes. O jornal espanhol “El País”, em um editorial, já se antecipou e deu a medalha simbólica às Coreias, lembrando que:
Se os jogos olímpicos foram estabelecidos na Antiguidade como um período de trégua, se pode afirmar que estes Jogos Olímpicos de Inverno cumpriram com sua função. Os gestos e o diálogo aberto ao nível máximo em apenas algumas horas entre representantes da ditadura do norte e a democracia do sul eram impensáveis poucas semanas atrás.
Recapitulando cinco dos tais gestos da geopolítica de inverno, aos mundialíssimos leitores que não acompanharam estes episódios:
DESFILE
Como relatado pela Folha, as duas coreias desfilaram juntas sob uma bandeira unificada durante a abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno. O público aplaudiu de pé. Foi a quarta vez desde o fim da guerra de 1950 em que os países marcharam juntos nesse evento — com ainda mais relevância, pois os jogos são disputados em solo sul-coreano. A Coreia do Norte boicotou os Jogos de Verão de 1988 nesse país. Thomas Bach, presidente do Comitê Olímpico Internacional, dedicou grande parte de seu discurso para elogiar a atitude das duas Coreias: “Vocês mandaram uma poderosa mensagem de paz para o mundo”.
CONVITE
Esta edição dos jogos também entusiasmou por contar com a presença de Kim Yo-jong, irmã do ditador norte-coreano Kim Jong-un. É a primeira vez em que um membro imediato da família governante norte-coreana pisa na Coreia do Sul. Kim Yo-jong entregou uma carta ao presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, para que participe de uma reunião de cúpula em Pyongyang, a capital ao norte. Caso o encontro ocorra, será o terceiro do tipo, após as reuniões entre Kim Jong-il –pai do atual ditador– teve com presidentes sul-coreanos em 2000 e 2007.
DIPLOMACIA
Esses gestos olímpicos são resultado de meses de discreta diplomacia conduzida nos bastidores, como informa o jornal americano “New York Times”. Boa parte do trabalho coincidiu com os testes de mísseis balísticos intercontinentais na Coreia do Norte e com a detonação de seu artefato nuclear mais potente até agora. Enquanto os EUA ameaçavam a Coreia do Norte, os organizadores do evento e o governo sul-coreano viram nos Jogos Olímpicos de Inverno uma oportunidade para reativar as conversas entre os países e solucionar a crise nuclear.
ESTADOS UNIDOS
Segundo o jornal britânico “Guardian”, a aproximação entre as duas Coreias durante os Jogos Olímpicos de Inverno desagrada os EUA, que preferiam intensificar a pressão à ditadura de Kim Jong-un. As diferentes abordagens em relação à crise nuclear têm afastado EUA e Coreia do Sul, e Donald Trump já manifestou publicamente seu desdém pelo presidente sul-coreano. Na quinta-feira (8), o vice-presidente americano, Mike Pence, prometeu que os EUA vão em breve “revelar a rodada mais dura e agressiva de sanções econômicas contra o norte”.
REALISMO
Mas, com todos esses gestos nos Jogos Olímpicos de Inverno, as duas Coreias vão poder resolver as décadas de conflito? É pouco provável, segundo uma análise publicada pelo jornal americano “Washington Post”. A Coreia do Norte não deve abrir mão de seu arsenal nuclear, e os Estados Unidos não devem remover suas sanções. Ademais, a reaproximação entre as duas Coreias não é exatamente popular em nenhum dos dois lados de península. Houve protestos na Coreia do Sul, por exemplo, queimando bandeiras do vizinho do norte.