Por que Angela Merkel ainda não formou o seu governo, quase 4 meses após as eleições alemãs?
Os mundialíssimos leitores deste blog e desta Folha devem se lembrar que em 24 de setembro alemães foram às urnas em suas eleições. Mas já se passaram quatro meses desde então e a chanceler, Angela Merkel, ainda não formou seu próximo governo — arrepiando seus aliados na União Europeia, acostumados a ver na Alemanha o compasso político desse bloco econômico.
Merkel avançou algumas casas no tabuleiro no dia 12 de janeiro, quando conseguiu um pré-acordo com o rival, Martin Schulz, para uma coalizão. Mas o trato não é definitivo e o governo pode estrear só em abril. Ou seja, um semestre após o pleito. “Zwischen Immer und Nie”, tomando emprestada a expressão em alemão do poeta Paul Celan (1920-1970). “Entre sempre e nunca.”
MAS QUANDO ESSE IMPASSE COMEÇOU?
Em 24 de setembro, quando os alemães votaram em suas eleições. O partido CDU (União Cristã-Democrata), de Merkel, obteve 32,9% dos votos em sua aliança com a sigla bávara CSU. O segundo lugar ficou com o SPD (Partido Social-Democrata), de Martin Schulz, com 20,5% . A formação de direita ultranacionalista AfD (Alternativa para a Alemanha) teve 12,6% — a surpresa do pleito.
O QUE ESSES NÚMEROS SIGNIFICAM?
Que ela precisa entrar em uma coalizão para poder governar — o que, aliás, tem sido a praxe na Alemanha. Somente aliada a outras forças Merkel terá a maioria necessária no Parlamento.
MAS SE É A PRAXE, QUAL É O PROBLEMA?
Merkel governa há 12 anos, em 8 dos quais esteve aliada ao SPD de Martin Schulz. Essa aliança é conhecida como “grande coalizão” na Alemanha. A aliança com a conservadora CDU, porém, pode ter prejudicado o partido social-democrata, que teve seu pior resultado em décadas. Com isso em mente, Schulz decidiu voltar à oposição e não montar um governo com Merkel de imediato.
MAS ESSA ERA A ÚNICA OPÇÃO DELA?
Não. Sem Schulz, Merkel tentou fazer uma aliança com os Verdes e com os liberais do partido FDP. Essa ideia de coalizão era apelidada de “Jamaica”, porque as cores das três siglas remetem à bandeira do país. As negociações, no entanto, fracassaram. Sem a opção jamaicana, Merkel se viu com três saídas: governar em minoria, aceitar novas eleições — ou voltar a negociar com o SPD.
O QUE ELA FEZ?
Voltou a negociar com o SPD. O pré-acordo de 12 de janeiro, ao qual Merkel chegou depois de semanas, precisa agora ser aprovado na conferência social-democrata do dia 21 e destrinchado entre os partidos. Apesar da pressa de Merkel, o governo pode ser inaugurado apenas em abril.
POR QUE A PRESSA?
A Alemanha é a maior economia europeia. Com o fim do mandato de Barack Obama na Presidência dos EUA, Merkel tem sido vista como a líder natural de uma certa cultura política. Em anos de crescente populismo e de desafios ao sistema, é natural que seus aliados estejam ansiosos à espera de um governo estável na Alemanha. O presidente francês, Emmanuel Macron, é um deles: ele se elegeu em maio prometendo reformar a União Europeia, mas não pode fazer isso sem Berlim.
MAS A ALEMANHA ESTÁ SEM GOVERNO HOJE?
Não. Na verdade, analistas insistem em que toda essa ansiedade é desmedida. A Constituição alemã prevê esses períodos entre eleições e a formação de um governo. O gabinete anterior segue em exercício com os mesmos poderes e sem prazo. Merkel continua sendo chanceler, na aliança com o SPD, até a formação do novo governo. O país, portanto, não está paralisado nestes meses.