Notícias falsas afetam a tragédia de Aleppo

Diogo Bercito

O termo “fake news”, “notícias falsas” em inglês, é o novo clichê da internet nestes últimos meses. Desde a eleição do republicano Donald Trump nos EUA, em novembro passado, a expressão tem tomado a rede — e tem sido utilizada com diferentes interesses. A vitória de Trump e o “brexit”, a decisão britânica de deixar a União Europeia, parecem ter sido influenciadas por uma série de inverdades ou, no mínimo, pela desinformação dos eleitores. A questão é tão grave que o Facebook tem criado novas ferramentas para monitorar seu conteúdo.

O fenômeno afeta, também, a cobertura da tragédia em Aleppo, na Síria. A cidade, que está cercada pelo Exército e foi bombardeada pela Rússia, tornou-se assunto de diversos relatos inverídicos. Um dos mais graves foi o uso de uma imagem do campo de refugiados palestinos de Yarmouk como se fosse uma fotografia de Aleppo (é a imagem que ilustra este relato, no topo).

O jornal britânico “Independent” relatou, ainda, que cinco pessoas foram detidas no Egito após tentar simular um vídeo sobre Aleppo. Eles admitiram planejar distribuir as imagens como se fossem da cidade síria. Outro caso foi o vídeo de uma garota correndo entre destroços — era o trecho de um clipe musical.

A estratégia, que serve para reforçar o argumento de que há uma crise humanitária ali, causa evidente dano. É saudável questionar as notícias e confirmá-las antes de apertar o botão de “compartilhar” no Facebook. Mas a desconfiança em relação a Aleppo, por exemplo, tornou-se cínica e serviu a outros objetivos: contrariar o fato de que essa cidade síria, outrora a mais importante do país, foi destruída por meses de ataques do regime e da Rússia.

A mídia iraniana PressTV, por exemplo, publicou recentemente uma análise sobre como “a mente ocidental está desorientada com as notícias falsas”. O texto afirma haver um “império anglo-americano-sionista” em busca de dividir o Oriente Médio para que Israel continue a expandir-se na região. O Irã, não por coincidência, apoia o regime sírio e os bombardeios russos.

O jornal britânico “Telegraph” publicou uma interessante reflexão sobre o assunto, citando o caso de Bana Alabed — uma menina de 7 anos de idade que vinha relatando o cerco em Aleppo. Ela foi recentemente retirada da cidade. Nas palavras do diário:

A primeira resposta on-line a ela não foi de empatia, mas de total cinismo: “Uau! Estou chorando mas consigo tuitar… Propaganda.” Enquanto bombas estavam sendo lançadas em Aleppo, uma guerra de palavras estava sendo travada virtualmente fazendo com que o ‘fake news’ dos EUA parecesse brincadeira de criança. Moradores da cidade, alguns deles ativistas anti-governo, publicaram vídeos do que diziam temer serem suas últimas mensagens ao mundo antes de um massacre em potencial. Comentadores imediatamente disseram que os vídeos eram propaganda coordenada.