A crise no Mediterrâneo é de imigração ou de refugiados?
O canal árabe Al Jazeera propôs, na última semana, uma interessante discussão ao explicar por que não usa a palavra “imigrantes” quando noticia as levas de mortos no mar Mediterrâneo. A palavra, segundo o editor Barry Malone, não descreve corretamente o desastre regional.
Mais de 340 mil pessoas cruzaram as fronteiras europeias nos sete primeiros meses deste ano, 100 mil delas apenas em julho. Mais de outras 2.400 morreram na tentativa de cruzar o Mediterrâneo, deixando para trás países em conflito como a Síria e a Líbia. Nesta quarta-feira, milhares cruzaram a fronteira entre Macedônia e Sérvia.
Nas palavras de Malone,
Não existe uma crise de “migração” no Mediterrâneo. Há um grande número de refugiados fugindo de miséria e perigos inimagináveis, e um menor número de pessoas tentando escapar do tipo de pobreza que leva alguns ao desespero.
Da mesma maneira, na Folha não escrevemos que pessoas retiradas do mar tenham sido “resgatadas” pelas autoridades europeias, e sim “interceptadas”.
A diferença entre “imigrante” e “refugiado” é, para Malone, seu uso político. É conveniente a governos, diz, descrever essas multidões como imigrantes em busca de melhores condições financeiras. É a partir desse uso que políticos como Philip Hammond, chanceler britânico, se referem a “imigrantes saqueadores” e alertam a uma suposta ameaça à qualidade de vida na Europa.
Os dados, porém, sugerem que o maior grupo de pessoas cruzando as fronteiras europeias são sírios –que escapam de uma guerra que já deixou mais de 220 mil pessoas mortas e um sem-número de deslocados internos. Outros refugiados vêm de nações como Afeganistão, Iraque, Líbia, Eritreia e Somália, fugindo de horrores que, de tão urgentes, fazem uma viagem de barco cruzando o Mediterrâneo parecer a melhor das alternativas.