Existe monge budista terrorista?

Diogo Bercito
Monges protestam contra resolução da ONU que pede cidadania aos rohingya. Crédito Khin Maung Win - 16.jan.2015/Associated Press
Monges protestam contra resolução da ONU que pede cidadania aos rohingya. Crédito Khin Maung Win – 16.jan.2015/Associated Press

Sentado em posição de lótus, no topo de uma montanha, observando uma folha seca lentamente desprender-se dos galhos de uma árvore, concentrado apenas em sua respiração. Talvez você pense nisso, quando alguém mencione um monge budista.

Provavelmente não vem à sua imaginação a cena que foi notícia na semana passada, quando monges budistas foram às ruas para protestar contra o projeto do governo que permitia o voto da minoria rohingya –há mais de um milhão deles em Mianmar, mas eles não são considerados cidadãos.

O quê? Existe monge violento?
Sim. Em 2012, 200 pessoas foram mortas em embates entre budistas e muçulmanos, em Mianmar. A maior parte das vítimas eram muçulmanos. A revista “Time” publicou o perfil de um monge que é “o rosto do terror budista”, ao promover ações contra mesquitas e negócios administrados por muçulmanos no país. Há até um verbete sobre budismo violento, na Wikipedia.

O que é Mianmar?
É um país no sudeste asiático que recentemente começou a abrir-se politicamente, depois de meio século com as portas fechadas. Talvez você conheça o lugar como Birmânia, seu antigo nome.

Existe muçulmano lá?
Existe essa minoria chamada rohingya, marginalizada no país. Muçulmanos, eles teriam imigrado de uma região que hoje faz parte de Bangladesh durante o domínio britânico. Os muçulmanos são cerca de 10% em países como Mianmar e Sri Lanka, onde há casos de perseguição por parte da maioria budista.

Por que eles são perseguidos?
Um texto do “Washington Post” tentou explicar essa questão, recentemente. O jornal americano cita, por exemplo, uma mensagem enviada a jornalistas pelo cônsul-geral de Mianmar, em 2009, afirmando que a minoria rohingya é “feia como ogros” e não tem a pele “macia” como os membros da etnia local.

Mas é um caso isolado?
Não exatamente. Sabe a Aung Suu Kyi, líder da oposição que foi recentemente solta de sua longa prisão? Ela tem um prêmio Nobel da Paz etc. E se recusa a usar a palavra “rohingya”, o que seria considerado, no país, como um reconhecimento da existência dessa comunidade, diz o “Washington Post”. O “Hufington Post” discute a questão da líder silenciosa em outro texto.

É só em Mianmar?
Não. O “New York Times” publicou recentemente um texto sobre budistas radicais no Sri Lanka. “Monges budistas extremistas contradizem uma religião canonicamente vista como não violenta e muitas vezes percebida como não política. Como monges radicais na Tailândia e em Mianmar, os linhas-dura do Sri Lanka reservam uma ira especial aos muçulmanos”.

Por quê?
Difícil responder. A rede britânica BBC sugere que o budismo seja tão pacífico quanto o cristianismo, na prática. Aliado a um Estado, recorre à violência para defender seus interesses. Em Mianmar e no Sri Lanka, por exemplo, esse conceito está ligado à ideia de autoridade moral de seus monges. Outras análises afirmam que monges estiveram historicamente ligados, na região, aos esforços de manter uma “supremacia budista” –por exemplo, no século 19, enquanto temiam que missionários europeus afetassem a “identidade budista” local. Teria sido produzido, assim um “nacionalismo budista”.