Leitores perguntam sobre a guerra em Gaza
Recebi, durante a semana, uma série de mensagens de leitores que –estimulados pelo último relato neste Mundialíssimo blog— me perguntavam sobre Gaza. Como o tema ainda é relevante, e estará na pauta regional e internacional, voltamos aqui a ele.
Estaremos sempre abertos a perguntas. Sobre Gaza, ebola, o interior dos EUA ou o futebol com carcaças de bode no interior da Ásia. O que for. O único limite é o mesmo imposto ao blog irmão deste, o Orientalíssimo (clique aqui para visitar): comentários ofensivos não serão autorizados ou reproduzidos aqui. Dito isso, vamos às dúvidas, que agrupei em quatro questões:
Como as pessoas se divertem em Gaza?
A resposta fácil é que não se divertem. O cinema de Gaza é um prédio em ruínas, quase uma lembrança triste dos dias mais liberais, antes que o estreito de terra fosse governado pela facção palestina Hamas. Concertos de música também são problemáticos –entrevistei um rapper, no ano passado, que me dizia que é difícil conseguir autorização para um show, já que a liderança em Gaza insiste em músicas islâmicas tradicionais (clique aqui para ler). Álcool, é claro, é proibido. Mas as pessoas vão à praia, ainda que vestidas, e o elemento cultural envolve também a diversão em longas conversas fumando e bebendo chá. A resposta difícil é, então: as pessoas se divertem, em Gaza, como podem.
O Hamas impede ou tenta controlar o trabalho dos repórteres em Gaza?
Há relatos de que, em alguns casos, sim. Mas, e aqui falo da minha experiência como repórter da Folha e na de colegas estrangeiros com quem convivi na região, a censura não é a regra. A entrada a Gaza passa pelo controle do Hamas, sim. Por outro lado, os militantes nunca me deram qualquer sinal de que se importassem com o que eu escrevo. Em diversas vezes me sentei com líderes da facção e fui recebido com educação. Em não poucas ocasiões discordamos durante a entrevista e nem por isso encerramos o encontro sem um gentil aperto de mão.
Por que foi criado o Estado de Israel e não um Estado palestino? Com um Estado palestino, as tensões não se dissipariam?
São questões fundamentais aqui, e sem resposta. O Estado palestino era previsto na resolução da ONU de 1947. Os judeus aceitaram. Os árabes, não. O Estado de Israel foi criado por um movimento de independência, em 1948, e a tensão aí é evidente. Mas, ao contrário do que por vezes se diz, o Estado de Israel dificilmente pode ser considerado a raiz de todos os problemas no Oriente Médio. A região foi vítima de políticas coloniais, como um todo, e não sofre apenas pelo conflito árabe-israelense.
A guerra em Gaza não pode ser considerada um genocídio, visto que o número de palestinos mortos é muito maior do que o de israelenses?
Essa não é a definição exata de genocídio (e sim a morte deliberada de um grande grupo de pessoas). O fato de haver disparidade nos números tem mais a ver com a diferença de capacidade militar do que com a intenção. Mas há quem diga, sim, que a guerra em Gaza foi a de um genocídio –o que pode ser contrariado pelo argumento, ainda que controverso, de que a morte de civis em Gaza é também responsabilidade do Hamas. A palavra “genocídio” é delicada e governos em geral evitam usá-la, nesse caso, pela carga política. A revista “Vice” tem um texto interessante sobre o tema, clique aqui para ler.